sexta-feira, 5 de março de 2010

Sexta Das Meninas

(este texto foi criado a partir da musica - Noite das Meninas - de Tulio Borges)

sexta-feira final de expediente
fim de um tédio início de outro
estou morto sou só um corpo
um corpo que perambula
alimenta anda trabalha vive
como um corpo morto a cumprir tarefas
acabou a semana
desligo
o ar condicionado e
luzes
tranco a porta
na noite quente abafada
o ar seco me fere a garganta
corta

Quarto apertado ar parado na janela de cela paisagem da noite fria cenário de sombra não tem luz só tem fumaça o óculos embaça. Não tem luz tem lâmpada não tem fumaça tem gente que respira que respira o vapor de corpo vivo e se mistura na boca ao gosto de álcool e de saliva.
Não. Aqui ninguém respira aqui é só a noite escura na lâmpada amarela baixa balança perto da cabeça enquanto a gente divide um pouco do ar e da língua funda que encosta e troca e pega e tira e experimenta e volta e pára escorraça e geme e continua no álcool e na boca a noite escura e seca. Queima a respiração debaixo da lâmpada amarela na esquina da parede áspera encurrala arde e arranca o suor do álcool na boca as mãos espalmadas ardendo rasgadas abertas fechadas entram com o gosto de medo molhado de gasolina e saliva.
Estou morto estou vivo estou na caverna deglutindo gozo e gemidos monossilábico primitivo no ocre gosto da pele que sobe e desce na mordida entre as coxas na minha boca palato e virilha e não respiro sinto o ocre a poeira o chão nos lábios e nas costas saliva e pressa óleo e pernas que me prendem sugam o pescoço e me invadem lábios um medo molhado nervoso me suga ofegante o cheiro de floresta no leito da noite. Um bicho que reconhece no escuro um corpo na urgência da noite fina enquanto abre fecha vira passa a língua logo acima a lâmpada ilumina apaga e queima no vapor desconhecido do incenso a pele suada engole desvario e tristeza.


Nas esquinas, nas paredes escorre
a noite fina das meninas
da janela da cela entra bêbada em mim macia
derrama a língua no céu da boca
veludo e melancolia
o pote cheio de agonia

Um comentário:

Joi disse...

uooou! que envolvente e rítmico e forte e intenso e íntimo e envolvente de novo e de novo!
bonito!