segunda-feira, 20 de agosto de 2007

José Maria José

José Maria José

Nascera com vocação para personagem.

E desde cedo, sob os holofotes do berçário, se destacara dentre tantos recém nascidos. O chorinho ritmado, a beleza natural que se mantinha interessante, mesmo quando dormia, conqusitava a atenção dos visitantes. Na mais tenra idade já pôde sentir a fonte do talento a se derramar sobre sua cabeça e, embalado por uma certeza interna, o carisma prematuramente já se manifestava. José Maria, era o bebê.

Tudo acontecia como em um filme onde ele se portava tal qual um veterano que sempre sabe o que fazer - desenhar, comer, chorar - sem nunca perder a deixa.

Não havia quem desse mais brilho ao que se supõe corriqueiro. Não subia em árvores, era o Tarzan. Polícia e ladrão, imbatível - ora do bem, ora do mal. Tropeçava ao pular corda, por certo era desengonçado, no entanto, as marcas espalhadas pelas pernas, os tombos - porque não dizer vexames - cobriam seu rosto com lágrimas sentidas - de modo que até o fracasso lhe caia bem.

Ninguém sabe dizer o motivo, o fato é que José Maria, do dia para a noite, virou Zé. Ele jamais contestou,pois pulsava mais forte o talento e o desejo de ser um bom personagem. Acostumou-se. Contudo, não seria mero figurante de uma vidinha tão sem propósito, afinal sua persona nunca o deixava na mão.Trazia a vida na ponta da língua como se fora um velho texto ao qual a memória feroz resgatara. Sem improviso.

Zé Maria borbulhava de orgulho, ao ouvir o próprio nome, escolhido por sua mãe. Não que ela fosse perfeita mas cumprira o papel de personagem-mãe a contento, não decepcionou, deu ao filho este patrimônio, o nome composto. Nosso esforçado amigo, já adulto, resolveu procurar uma numeróloga, em busca de confirmar o destino. Bobagem, Zé! Acaso não sabe que o destino não emite nota fiscal?

E veio então a revelação da numeróloga ruiva: Zé aproveitava mal seu potencial, era personagem restrito em suas concepções, não utilizava o poder do nome composto, que correto ou inverso, serviria a dois patrões. Maria José, José Maria, ora bolas, tanto faz - lhe explicou a estudiosa - possuia muitos pontos a se explorar, energeticamente falando... era preciso um texto original, de preferência inédito, pois que esse negócio de interpretação era pouco para tantos personagens contidos naquele nome.

- José, Maria José, Maria – sentenciou a mulher diante de um Zé estarrecido - põe ímpeto nesta vontade, se vira, vê se vira autor!!!

José Maria, sem conseguir encontrar o tom do momento, sentia uma insurreição escandalosa, náuseas, e todo o seu método de cultivar o personagem escoando pelo ralo. Na verdade, também ele, se cansara das mesmas velhas histórias.

Um motim lhe fazia tumulto pelo corpo, barulho de canhões, enfrentamentos, batalhas duríssimas.José Maria, ou qualquer nome que o valha, já não se importava, saiu pela rua, onde tudo parecia estranho - ele mesmo não se reconhecia, apenas percorria o caminho para casa.
O suor lhe gotejava a testa.
Através da janela a paisagem era imaginária.
Fechou as cortinas. Sentou-se. As mãos pousadas sobre o teclado.
O olhar novamente se perdeu, foi parar em outras terras,sem rumo, tomado pelo mais quixotesco de todos os personagens: o Autor.
(...)
Tudo em branco.Histórias, vidas para criar.
(...)
Onde foi parar todo mundo? Sei lá.
(...)

2 comentários:

sensação de violeta disse...

Cris...caramba vc me emocionou, vontade de abraçar você agora!!!
Vc extraiu coisas que estão dentro de mim...o potencial, as histórias...o vazio...confirmação do destino rs...ser figurante, ou ser o personagem principal?Meus personagens são confusos, intensos...assim como a autora, rs.
Com mais essa vc me faz colocar ímpeto no meu destino!!!!beijos de todos os personagens que habitam em mim.

Anônimo disse...

Maravilhoso!!!
Parabéns mais uma vez!