domingo, 12 de agosto de 2007

SOBRE ANJOS

Restabelecimento. Devo dizer a todos que morri um pouco por esses dias e ainda estou renascendo. Tempos de resguardo e fragilidade. Morri um pouco na madrugada, morri um pouco ao meio dia, às quatro horas da tarde, o sol me deixava cega, o ar estava parado, eram quatro horas da tarde e eu já não me pertencia.

Quero flores, orquídeas, lilases, cenários e perfume, perfume para acordar a vida, acordar desta morte, da solidão grotesca que me roubou um pedaço da alma e me respirou a vida.

É que um anjo de ternura e tormento visitou-me na madrugada. Quando ele me encontrou eu estava distraída porque era outono e alta madrugada, o ar mais frio e a noite brilhante me trouxeram a falsa impressão de estar protegida. Quisera eu ter na minha natureza uma seriedade magistrada, uma frieza científica feita de lógica, dedução e método. Meu Deus, quando vou aprender a carregar a razão a tiracolo?
Mas não. Achei graça, dei asas ao anjo - sorri, o sorriso dos olhos, contei as melhores histórias - permiti que ele se aproximasse: incerteza, céu e inferno, homem, mulher, inocência e crueldade. Desejei estar ali e atravessar a noite entre suas asas, leves, grandes, afiadas...

Ele respirou em mim, soprou em minha boca aquelas palavras estranhas, e ainda que me seja proibido tocar em anjos, ele me tomou o ar, e ficou no lugar, sem que eu me desse conta, uma solidão carnívora. E de tal maneira se alojou entre as minhas costelas, na minha traquéia, me deixou sem fala, fez doer o meio do peito, me tirou as forças e criou uma dor sombria. Porque eu deixei e porque estivesse desatenta, me perdi de mim e restou apenas uma solidão dentada.

Custa a sarar o rasgo entre as costelas, a dor incômoda próxima às axilas, por onde minha alma fugiu e foi passear por aí.

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