segunda-feira, 4 de maio de 2009

Os Deuses do Teatro ou Pequenas Orações sem Nenhuma Edição







Sento na poltrona, me ajeito, respiro. As luzes se apagam. Começa a peça. Começa a vida.
Dentro do teatro, no escuro do teatro, me recomponho. Tudo dentro de mim se reorganiza e desorganiza e encontra ordem.
O cinema. O cinema também adoro. Mas o cinema é sonho. O teatro é necessidade, é cura. É norte. É a compreensão do caos. Eu saio do caos dentro do teatro. No teatro não há mentira. Já entendi minha vida, muitas e muitas vezes dentro de um teatro. Lá onde os Deuses vivem, repousam. E não há jogos.
Quem acha que a existência se acomoda na poltrona está em outra perspectiva, ainda está cego. No teatro não há representação, não há paredes, não há máscaras.
As máscaras teatrais são vivas. Enquanto na feira da realidade distribuimos a nossa mais sincera persona. A caricatura de nós está além das portas do teatro. O ator canastrão atua fora dos palcos.
A vida está no teatro, a vida está onde tudo é real. Ainda que pensem o inverso.
No escuro, no silêncio antes do inicio, na primeira luz, na primeira voz, na palavra, no gesto: os Deuses estão presentes soprando a vida. O homem será mostrado. Ali, onde todas as coisas são ditas. E assim deve ser, na vida. O ator genuíno nos mostra o espelho patético, o avesso, a costura por dentro, não consegue ser um mentiroso. Porque ele precisa da verdade das coisas por dizer. Porque ele não recita, vive. Simplesmente.
O ator é a voz de Deus. Deus está ali na poeira que levanta com a luz, está na cortina, na mágica da expressão do que é humano. Ali, misturado à poeira o belo, o ruim, o perverso e estranho devem ser assumidos. O humano é exposto em território livre. No templo sem dogmas. Onde as coisas todas somos nós, onde as palavra, o gesto e a imperceptivel pausa preenchem todos os espaços, intoxicam o ar que iremos respirar.
É o limite sem limite de possibilidades.
O Teatro está revestido desta energia que nós expoe, por dentro, por fora, no inteiro e no resto, na confusão e na clareza. É um oráculo, um olho sem fronteiras, caminho para a legitimidade da existência.
Dentro do teatro, no escuro do teatro, tudo em nós é divino e humano. Em volta de uma platéia ou totalmente sozinhos, afundados na cadeira, somos pequenos e grandiosos, somos deuses vivos.
O Teatro nos redime, nos perdoa de nós, por nós.

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